O valor da mercadoria segundo a análise marxista

Por Christopher Rodrigues (*)
Uma das principais preocupações de Karl Marx era compreender a complexidade da mercadoria. O primeiro capítulo do livro "O Capital" (vol. 1), a principal obra de Marx, busca desvendar os determinantes do valor de uma mercadoria, valor este que tanto confundiu a cabeça dos economistas clássicos. No capítulo Marx dizia que um bem possui dois tipos de valores: valor de uso e valor de troca. O valor de uso é medido pelo trabalho concreto, ou seja, do trabalho que depende da habilidade humana. O valor de troca da mercadoria está relacionado à quantidade de tempo que o trabalhador gasta para produzi-la.

“À primeira vista, a mercadoria parece uma coisa trivial, evidente. Analisando-a, vê-se que ela é uma coisa muito complicada, cheia de sutileza metafísica e manhas teológicas”. (p. 197).  A mercadoria é um produto do trabalho que satisfaz as necessidades básicas dos seres humanos. O valor de troca de um bem é mensurável e simplesmente determinado pela quantidade de trabalho despendida para a produção do mesmo. Por outro lado, todo bem tem valor de uso e este é agregado pelo produtor no processo de produção, embora seja imensurável. Os consumidores apenas reconhecem tal valor e adquirem o bem que mais necessitam. Todo objeto que é útil tem valor de uso, e tem valor de troca porque o mesmo tem utilidade no mercado.
Cada mercadoria possui seu próprio valor de uso: o café alimenta, o casaco aquece etc. Mas, todas elas foram produzidas pelo uso da força de trabalho. Então, o trabalho serve para igualar todas as mercadorias. A utilidade não pode ser quantificada, mas o tempo dependido na fabricação do bem, pode.

“Como valores de uso, as mercadorias são, antes de mais nada, de diferente qualidade, como valores de troca só podem ser de quantidade diferente, não contendo, portanto, nenhum átomo de valor de uso”. (p. 167). 

“Ao desaparecer o caráter útil dos produtos do trabalho, desaparece o caráter útil dos trabalhos neles representados, e desaparecem também, portanto, as diferentes formas concretas desses trabalhos, que deixam de diferenciar-se um do outro para reduzir-se em sua totalidade a igual trabalho humano, a trabalho humano abstrato”.

A princípio, valor de troca de uma mercadoria era determinado pela comparação da quantidade de trabalho despendida em uma e em outra. Por exemplo, 1 casaco vale 20 varas de linho. O que significa que o tempo de trabalho utilizado na produção de um casaco é o mesmo que fora dependido com 20 varas de linho.

“Como o valor de troca é uma maneira social específica de expressar o trabalho empregado numa coisa, não pode conter mais matéria natural do que, por exemplo, a cotação de câmbio”. (p. 207). “Se as mercadorias pudessem falar, diriam: É possível que nosso valor de uso interesse ao homem. Ele não nos compete enquanto coisas. Mas o que nos compete enquanto coisas é nosso valor. Nossa própria circulação como coisas mercantis demonstra isso. Nós nos relacionamos umas com as outras somente como valores de troca”. (p. 207).

No sistema capitalista só sobrevive aqueles que são eficientes e adaptáveis ao dinamismo do mercado. Por exemplo, se um indivíduo é um alfaiate, sua profissão produz o valor de uso: ele sabe fazer roupas. E, roupas têm valor de uso. Mas, se ele demorar mais de uma hora para produzir um casaco, estará sendo pouco produtivo. Algum outro alfaiate, ao produzir mais em menos tempo, colocará mais peças no mercado e, por conseguinte, lucrará mais do que o primeiro. Portanto, o primeiro alfaiate tem possibilidades reais de deixar o mercado, enquanto que o segundo será promovido.

Em decorrência de dificuldades ocasionadas por questões climáticas desfavoráveis (seca ou enchente) ou de ineficiência na estrutura de custos, o trabalho necessário no processo de produção será maior, o que leva, consequentemente, a um aumento do bem final.

“Se o tempo de trabalho necessário para a produção do linho dobra, talvez em consequência de crescente infertilidade do solo em que se produz o linho, então duplica seu valor. Em vez de 20 varas de linho = 1 casaco, teríamos 20 varas de linho = 2 casacos, pois 1 casaco contém agora apenas metade do tempo de trabalho das 20 varas de linho. Ao contrário, se diminui à metade o tempo de trabalho necessário para a produção do linho em consequência, por exemplo, da melhoria dos teares, cai também o valor do linho pela metade”. (p. 181-182).

Por outro lado, uma redução de custos decorrente de um melhoramento tecnológico, levará a uma diminuição do tempo de trabalho despendido, o que, por sua vez, repercutirá no preço da mercadoria.“(...) o valor do casaco cai à metade, então 20 varas de linho = 2 casacos. Permanecendo constante o valor da mercadoria A, cai ou sobe, portanto, seu valor relativo expresso na mercadoria B, em relação inversa à mudança de valor de B”. (p. 182).

O valor relativo de uma mercadoria está sujeita à mudança, embora seu valor permaneça constante. O valor também pode mudar, enquanto o valor em termos relativos continue constante. Ambos podem se alterar simultaneamente, no entanto, tal importância disso é ínfima.

“De fato: quando um homem troca seu linho por muitas outras mercadorias e, portanto, expressa seu valor numa série de outras mercadorias, então necessariamente os muitos outros possuidores de mercadorias precisam também trocar as suas mercadorias por linho e, por conseguinte, expressar os valores de suas diferentes mercadorias na mesma terceira mercadoria em linho”. (p. 192).

As trocas são realizadas por equivalentes, ou seja, 1 casaco é trocado por 20 varas de linho. Porém, com as dadas as dificuldades no processo de troca em que uma quantidade de mercadoria é trocada por uma quantidade de outra equivalente, hoje em dia, e já há muito tempo, a permutação de equivalentes no âmbito capitalista passou a ser realizada por um equivalente geral: o dinheiro.

Com o tempo, algumas mercadorias foram ganhando importância e assumiram o papel de dinheiro-mercadoria. Foi o caso do ouro (entre outros metais preciosos), do sal, do querosene e de outros bens de valor mercantil. Finalmente, os bens comercializáveis começaram a ser mensurados em termos monetários e adquiridos pela unidade monetária de cada país. O dinheiro já era um meio de troca na antiguidade, mas passou a ter um papel quase que insignificante na idade média, voltando a assumir um papel crucial somente com a chegada do capitalismo.  “Evidencia-se que não é a troca que regula a grandeza de valor, mas, ao contrário, é a grandeza de valor da mercadoria que regula suas relações de troca”. (p. 191).

“Para que o linho, isto é, qualquer mercadoria que se encontra na forma equivalente geral, possa, ao mesmo tempo, participar da forma valor relativa geral, ela teria de servir de equivalente a si mesma”. (p.195). Para Marx, o valor era, portanto, determinado no âmbito da produção e não da circulação, como afirmava os clássicos.

Marx colaborou de forma significativa, em sua análise dos valores de troca e de uso incidentes na mercadoria, com o aperfeiçoamento da compreensão de como as forças produtivas se correlacionam no sistema capitalista. Demonstrou com bastante veemência o significado de valor no âmbito da mercadoria. Os economistas clássicos não conseguiram compreender o dinamismo do sistema econômico e a importância do trabalho humano despendido no processo de produção. Os clássicos e todos aqueles que contribuíram para o enriquecimento do pensamento econômico têm o meu total respeito, mas nenhum deles e nem os mais notáveis intelectuais da ciência social tiveram o alcance que teve o alemão defensor do socialismo. Somente o primeiro capítulo do livro "O Capital" (Vol. 1) já nos ensina muito e nos traz revelações cruciais do modo de produção capitalista. Os capítulos subsequentes também vão a fundo no aspecto que se refere à análise do capitalismo.

O capítulo "A Mercadoria" do Livro "O Capital" precisa ser lido por todos aqueles que querem compreender o verdadeiro significado da economia capitalista. Aliás, o livro inteiro precisa ser trabalhado e analisado pelos estudantes de ciências econômicas e sociais. As análises e revelações de Marx significaram, em sua época, avanços inegáveis em termos de compreensão da dinâmica do mercado capitalista. Como se sabe, nada é considerado mercadoria sem ter valor de troca no mercado, mas para o produto ser trocado por outro (ou dinheiro), ele precisa ter utilidade para alguma pessoa, isto é, valor de uso.

Marx foi genial e suas obras são, até hoje, consistentes e explicativas. A figura do socialista alemão foi, paradoxalmente, resgatada pelos capitalistas e não pelos críticos do sistema econômico vigente. Então é certo que contribuição será ainda mais duradoura.

(*) Estuda economia na Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).

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